Luso Galaico Extreme 2012: Crónica Anunciada - Part I

24/04/12



 As emoções ainda fervilham de tal maneira na minha cabeça que verdadeiramente estou como numa descida de BTT, por onde hei-de ir? É o problema de alguém que vive estas coisas nos limites do emocional. Não há mesmo volta a dar-lhe. Nasce-se assim e assim se há-de cinzelar no fim. Também, se não fosse por paixão nada disto faria para mim sentido.

O dia amanheceu solarengo, como uma temperatura de fazer inveja: 23º às oito horas da manhã, em...Copacabana! Em Esposende a cena era bem diferente: não própriamente frio, mas nunca participei numa edição do Luso Galaico onde não imperasse o sol e o bom tempo e por isso sempre iniciei este extraordinário evento de BTT de calção e manga curta. Não! Este ano as coisas eram bem diferentes, mas em todos os aspectos: um extreme de dois dias, com pernoita em Caminha; um acumulado total de quase 5000 metros!! e a condição de se escolher entre as 6h30' e as 8h da manhã para partir para a aventura. Estas estavam programadas para serem dadas de 15' em 15', dentro daquele espectro horário. E eu, na pastelaria, para o pequeno almoço normal, ia observando a azáfama do pessoal que se ia aconchegando na  grelha de saída.
A presença do Sr. Vereador, Dr. Rui Pereira, era o testemunho vivo do alto valor que o Município de Esposende empresta a este evento, um verdadeiro cartaz do Concelho, a todos os níveis.
Momento da partida, na companhia do fantástico João PAulo
Eu tinha o GPS, que o amigo Hugo ( Propedal), a exemplo do ano passado, me emprestou, mas gostaria de sair com uma cara conhecida. Afinal, a ideia não era propriamente competir, mas partilhar a aventura. E encontrei na pessoa desse jovem exemplo de pessoa, que é o João Paulo, advogado, praticante de taekwondo, que ainda tem tempo para participar num grupo de teatro, mas acima de tudo um "gajo à maneira", o melhor companheiro que poderia ter encontrado para esta aventura. 
Mal demos por ela, estávamos prontos para o que aí vinha. É precisamente neste momento, às 8 da manhã, última oportunidade para iniciar a contenda, que a chuva aperta. A boa disposição, como sempre, imperava, e debaixo dos votos de boa sorte, lá fomos, a liderar o grupo nas primeiras centenas de metros. Sim, porque passado pouco tempo começámos a ver alguns galifões a distanciarem-se, distanciarem-se ...e pronto. Havia que meter o nosso "passo" e mais nada. Cedo comecei a verificar que algo se passava com o meu GPS. A trepidação desligava-o tão constantemente quanto eu o procurava ligar, num combate surdo de teimosia. E ainda cedo comecei a pensar que Deus me terá guiado para aquela hora de partida, mas principalmente para a companhia do João Paulo; é que este ano não iria ser a brincadeira do ano passado, onde falharam as pilhas do GPS num extreme de um dia. Confirmo agora a ideia de que não me teria sido possível concretizar este evento, pelo menos no tempo em que o fiz, se não fosse a parceria com o amigo de viagem. Adiante. Depois de passar terreolas e caminhos de cabras e de andar meio aos esses por aqui e por ali, dei comigo na escalada da Paradela! Primeira grande dificuldade do dia. Com chuva, pois então. Também  cedo me apercebi que a cadência da pedalada entre nós os dois era semelhante. Começamos a apanhar alguns elementos que haviam partido mais cedo, mas também outros que haviam partido connosco se iam distanciando paulatinamente de nós.
Exemplo de uma das vistas soberbas de um dos montes cruzados
Após uma subida há sempre uma descida. O problema, para quem como eu que desconhece por completo os trilhos por onde há-de passar, é que nunca se sabe que raio de descida iremos encontrar; se para partir pedra, se para saltar socalcos seguidos de socalcos, seguidos de socalcos, se vamos voar...enfim. Não se sabe. Nem me passou pela cachimónia que tendo em conta o estado do tempo de sábado e da chuva que tem caído no corrente mês, que o natural era haver lama. Ora, quando olho para aquela parede que tinha de descer e iniciando a sua descida sem decisão e estando ainda  a pensar se desço ou não, dou por mim como se estivesse literalmente num daqueles aquaparks, a descer uma rampa, só que aqui de lama e com socalcos e saltos e o catano, onde em vez de se seguir exclusivamente numa pista se entrecruzam várias outras, não tendo qualquer possibilidade sequer de decidir qual a melhor, muito menos parar...dou comigo a pensar nos dentinhos novos que havia posto há tão pouco tempo e rezo, rezo muito para que Tenhas piedade de mim...Só não fechei os olhos porque não dava. Fiz algo importante; coloquei o centro de gravidade do meu corpo todo para trás do selim e isso, mais as rezas, valeram-me não só descer uma descida que não voltaria a descer, nem que me pagassem, mas também não ter passado os 2 metros de trilho que separavam a encosta donde vinha da outra que se lhe seguia. Ufa! O João Paulo ria à gargalhada. Diz ele que foi lindo! Eu sei que tive um tempo na minha vida em que só pensei em sobreviver!!! 
Ponte de Lima, abastecimento
Refeitas as emoções, lá fomos, a caminho de Ponte de Lima, após 50 kms do início, para o primeiro e único abastecimento do dia.  Perdemos algum tempo aí, mas o espírito era mesmo este. Porém, ter-se-a iniciado um pouco antes de Ponte de Lima uma espécie de competição entre nós dois e um outro companheiro de aventura, bem nosso conhecido, que havia saído 30' antes de nós, e a quem passámos a designar por "Special One", "apenas" porque tinha o número um dos inscritos para esta contenda. Avancemos.
O regresso à "estrada" fez-se a custo e depois dumas valentes escorregadelas de bicla que gerou gargalhadas despregadas do João Paulo, fomos-nos aproximando de uma sequência de algumas valentes paredes onde as gentes se iam encostando para recuperar o fôlego. Às tantas, faltava uma, feita a penantes porque já não havia coração para mais, ficamos sós... Não! Espera! Vem lá o Special One!! Fizemos ali os dois uma promessa, mas vão ter de esperar pelo desfecho. 
Alguns enganos no GPS foi-nos fazendo perder tempo. Assim como as fotos ou as paragens para apreciar as muitas belezas que a natureza ia oferecendo. Mesmo considerando que desejávamos concluir a empreitada em 8 horas, mais coisa, menos coisa. Nesta fase, o João Paulo atravessava algumas dificuldades nas paredes, mas uma altura houve em que tive de parar para alimentar o corpo. Isso custou-nos mais algum tempo e outros companheiros alcançaram-nos. Já rondávamos Caminha, mas olhando para o perfil da etapa ainda teríamos de massacrar o corpo em algumas empenas. Antes, meu Deus! descidas do arco da velha. Umas afoitei-me, outras quando parei para pensar já era tarde e não dava para tentar. Agora sim, cheirava a Caminha e as 8 horas já distantes e as últimas escaladas do dia. Eu só ouvia o João Paulo lá atrás... &%()//&&%%$?"#...vale a pena traduzir? 
Finalmente a ponte que cruza o rio Coura e nos liga a bela Caminha. Chegados ao posto de controlo, a festa da chegada e a primeira pergunta: o Special One chegou a que horas? 18' mais cedo, resposta. E alguém de respeitosa idade diz que me conhece: "Você é famoso!" Viro-me para o João Paulo; "Estão a falar contigo!" "Não, não. É mesmo consigo! Até ganha medalhas no triatlo". " Eu? Bom, ganhei uma vez, em Aveiro. É verdade" " E até tem um blogue". "É verdade que sim, TriatloMania". Pois é...uma fã em Caminha, quem diria? Cumprimentamos-nos, desejamos-nos mutuamente votos de bom fim de semana. Agradeço a simpatia e realmente este mundo por vezes encolhe-se sobre nós.

O final do dia esteve impecável ao nível da organização, apenas com um senão. Falarei disso no balanço final sobre a organização. Depois de um banho morno, a acidez láctica começou a tomar conta das minhas pernas. Nesta fase já pensava como iria recomeçar o dia de amanhã. Tinha pela frente uma noite para recuperar e que poderia eu fazer para me ajudar a melhorar este estado todo empenado em que me encontrava? Primeiro; auto massagem, com um cremezinho para passar após esforços musculares intensos. Segundo; estiramentos antes de me afundar em cima dos colchões de ginástica que serviram de cama. Terceiro; elevação das pernas durante 30', aproveitando um banco sueco que serviu de mesinha de cabeceira. O jantar, esse tinha sido sorvido na companhia de alguns vizinhos comparsas de jornada. E após a partilha do saudável e alegre convívio, eu pedi desculpa e retirei-me para a camarata em que se tornou o pavilhão da escola secundária de Caminha passar a noite a procurar dormir, sem o conseguir. Ops!?  Que é aquilo??? Alguém trouxe uma tenda para o pavilhão. 

Uma fonte na montanha
Continua...

2 comentários:

joao rita disse...

Ganda joao uma fã . ri-me a bom rir aqui sozinho a ler esta tua magnifica cronica.

João Correia disse...

Viva, companheiro! É bom saber que te divertiste lendo. :)) Forte abraço e espero que até breve.