Clássica Ciclismo Póvoa de Varzim/Terras de Bouro

22/06/10




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A insónia dá para estas coisas; após ter caído duro que nem uma pedra no conforto do meu sofá, depois da janta, acordei quando deveria ir para a cama e ... vamos lá escrever a minha odisseia do passado Domingo. 
Resolvi incluir na minha preparação esta prova de ciclismo, organizada assim-assim pela Bikeservice, uma empresa do Manuel Zeferino, sediada na Póvoa de Varzim. "Já que não triatlas, não corres, só nadas e pedalas, ao menos fazes as provas que te são possíveis" o pensamento é este, até que...
O cartaz era atraente, com umas ofertas à mistura, mais almoço e por aí fora, tudo por 20 aérios. Bom, adiante. O percurso divulgado era igualmente atraente, partindo da Póvoa, passando por Barcelos, Prado (zona do sobe e desce), Amares, Gerês e...subida da Junceda, que para mim era algo que me confundia. Será que a Junceda é subida ao cume do Gerês, ou será aquela que nos leva a passar por S. Bento de Porta Aberta? Hmmm.   No plano da etapa falava em andamentos aconselháveis para a incógnita subida. A coisa parecia estranha. Adiante. Chegada a  Terras de Bouro, terra agradável, sulcada nas imediações da montanha. 
Até Amares seria em ritmo de passeio, e foi, com velocidades na ordem dos 28, por vezes 36, outras 25, enfim. De acordo com o previsto e com o pelotão unido, a fazer vibrar quem assistia à passagem do alvoroço provocado pelas motos da polícia e do próprio pelotão, todo equipado com o jersey da clássica, verdinho, de acordo com a côr que projecta o bonito Parque Natural da Peneda/Gerês para o mundo. Ouvia-se muitas palmas, a fazer lembrar que o ciclismo é uma modalidade muito, mas muito mesmo, popular no Norte. É inquestionável. Nos preparos que antecedem uma partida, vislumbrei uma cara conhecida: Venceslau Fernandes. Isso. No final, deu para trocar umas palavras, em grupo de convivas, com ele sobre o momento da Vanessa. Não vou divulgar, nem comentar. Ainda assim, ficam com uma ideia: a Vanessa já era. O futuro dirá se estarei ou não certo. Cá hei-de vir sobre isso falar quando oportuno for.
Mas, ainda sobre caras conhecidas, também outra antiga glória do ciclismo participou, o próprio Manuel Zeferino, que hoje em dia se dispersa entre o ciclismo e o btt. Mais outra, Joaquim Andrade. E ainda outra cara, esta famosa e nova, o João Cabreira.
A prova começou com algum atraso, mas com muita gente a participar, à volta dos 300 ciclistas. Muitas máquinas de fazer inveja à minha Mérida, que diga-se de passagem, se portou muito bem. Assim o montador estivesse mais à altura da montada. Já referi; até Amares foi em ritmo tranquilo, com muita conversa no pelotão, as graçolas do costume, umas puxadas aqui, travões logo a seguir, e os ganhos de experiência em circular em pelotão, muito importante. A seguir a Amares é que a porca torceu o rabo. 
O grupo que comandava o pelotão nem olhou para trás. Não era para olhar, quem tivesse pernas acompanhava, quem não tivesse que fosse lá ter. Eu consegui andar na cauda do pelotão da frente ainda algum tempo, talvez 15'/20'. Não sei bem. O que sei é que num repente o aparelhozinho começou a acusar 40km/hra. O trajecto até à Vila do Gerês, para além de sinuoso, é tipo carrossel, com inclinações suficientes para me fazerem perder o pelotão, que procurei retardar o mais que pude, mas era inevitável, Para mim e muitos outros. Foram-se formando grupos, que ora se juntavam, ora se separavam, dependendo sempre das tais inclinações. Por estas alturas lembrei-me das velhas glórias e pensei como ainda hoje têm uma pedalada impressionante, o suficiente para andamentos lá bem na frente. Num ápice, viramos para a Vila do Gerês, e dou comigo a pensar: "está quase a chegar o sofrimento". Claro que neste momento os andamentos eram mais leves. Tive no início uma breca. Alguém que vinha vindo comigo, ora à frente, ora atrás, me disse: "Conhece a subida da Junceda?" Respondi: "Sim, já a desci de carro." Ele, "Ainda bem". Fiquei intrigado, mais intrigado. Não estaria  a fazer uma grande confusão nesta minha tola? Talvez. E lá começamos a subir até à Vila. Aqui meti um andamento confortável e estive bem, ganhando posições, a respirar bem e passando pelo tal indivíduo que afinal estava sem razão se desconfiado da minha incapacidade em o acompanhar. Nunca mais o vi. A dada altura, houve um abastecimento de água e por detrás dos óculos de sol, vislumbrei, por entre as mãos que seguravam as garrafas de água, algumas que exibiam bidões. Com eram vários, fiquei com a ideia que seriam oferta ou coisa assim. Vai daí arranquei um. Arranquei porque eles estava bem seguro, na exacta proporção da dúvida de quem o segurava. Não cheguei a precisar dele e no final fiquei certo de que não me era intencionalmente destinado. Não foi por mal, mas ainda me fez rir esta cena. O pior é que um reles bidão é capaz de fazer estragos no corpo. Lá irei.
Bem, passada a Vila, torno à esquerda, de acordo com as indicações do percurso e do trajecto dos que me antecipavam. E aí começou o cabo dos trabalhos. Depressa fiquei com a certeza que não conhecia a puta da subida da Junceda. Filha da mãe. Que desgaste! Foi terrível. A páginas tantas, meti o andamento mais leve que tinha. Ainda assim, as pernas doíam. Um ou outro descansava na beira da estrada. Monte acima, lá ía passando um, outro passava por mim, mas a subida essa nunca mais acabava. A paisagem era deslumbrante. Magnifica mesmo, cada vez mais a ficar lá em baixo, muito lá em baixo. E eu a entender porque razão no plano da etapa se falava em andamentos aconselháveis. E porque é que o outro me perguntava se conhecia a subida da Junceda. E o bidão indevidamente recolhido a fazer estragos nas costas do lado direito. Pois é, como é que uma treta dum peso ligeiramente a mais pode ser tão incomodativo no corpo? E a subida continuava. Por vezes parecia que a coisa ia aliviar, o que me levava a meter um andamento menos leve, mas logo a seguir aí vem outra curva e mais pedras nos quadricípedes. Subir levantado aliviava, mas não dava para manter muito tempo. E as subidas sucediam-se, ora inclinado menos, ora inclinando mais. Pensei nos gajos dos tours. Deve ser realmente muito duro ser ciclista. Dei comigo a comparar provações de dureza física a que me tinha sujeitado, até ao momento. E esta estava a ganhar. Mais um abastecimento, mesmo no último cume da Junceda, e toca a descer. Muito perigosa quando feita em velocidade. Pela estreita estrada que era, pelo tipo de piso, alcatrão irregular, e pelos abismos que ladeavam a estrada. De modo que foi descer, sim, rápido, mas com cautelas, em solidão total. E desceu-se até voltar a subir. Cum caraças! As pernas não gostam nada disto. Voltar a subir? Dava jeito ter umas pernas de substituição. Como os pneus; trocava-se e pronto, sempre a andar. Mas, não. Tinham de ser aquelas mesmo. A páginas tantas, lá aparece um companheiro de aventura, vejo-o atrás, enquanto espreito, vejo-o à frente, passado pouco tempo. Não o consigo acompanhar, volta-se a subir e volto a empenar. Mais uma descida, comprida e alta velocidade. Aqui sim, decidi arriscar. Estava confiante, a estrada era boa, as bermas seguras pelas árvores, nada de ribanceiras. Alcanço dois companheiros. Passo a abrir, vou lançado, para "parar" logo a seguir. Nova subida e é a vez deles. Já estamos perto, eu , os que vão um pouco à minha frente, e os que vêm um pouco atrás. Alta velocidade até Terras de Bouro, com trânsito pelo meio, acima dos 50km/hra. Nunca pensei ainda ter forças para pedalar com tanta facilidade, ainda que a descer ou em plano. O problema era mesmo quando a coisa inclinava. Alcanço mais um ou outro, outros me alcançam a mim, mas fica difícil formar grupo. Terras de Bouro, e má sinalização, para mim e para outro que vinha logo atrás. Vejo gente que chegou antes de mim, vejo o insuflável da chegada, ouço o speaker da chegada, mas não vejo setas. Ah! Vejo uma mas fico na dúvida Pergunto onde é a meta. Dizem-me que é lá em cima. Subo na direcção em que supostamente seria a chegada, íngreme, mas não é por aí. Chegámos à conclusão que os mandávamos a todos para a outra banda e passamos uma vedação e entramos na recta da meta. Aí está, chegámos. 
Referi isso à organização, ao Zeferino. Estão convencidos que tudo estaria bem sinalizado. Eu e o outro e mais muitos outros não estamos.
No final, a opinião era unânime: esta clássica terá sido mais difícil que a sua homónima Póvoa/Srª da Graça. Eu fiquei satisfeito, porque esta última assustava-me um pouco. Já não assusta mais. Mas fiquei também satisfeito comigo por ter feito todo o plano da prova (esses metros finais para a meta eram canja), ao contrário do que fui ouvindo, que houve gente que virou por S. Bento de Porta Aberta (são menos 20kms), gente que na entrada no Gerês arrumou a bike no carro de outro e foi à boleia e gente que estes olhos viram apanharam boleia de carro, segurados nas laterais, serra acima. 
Missão cumprida, belo treino, muito duro e segunda prova velocipedista da minha carreira. Quase 117 km, 4h16'. Média total a pisar os 28km/hra, que atendendo ao tempo que demorou a subida, não foi mau de todo e a consciência que ainda há muito que "pedalar", mas, para quem pesava 96 kgs à dois anos e meio...

Abraços triatléticos.

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